31/10/2024 às 08h15min - Atualizada em 31/10/2024 às 10h30min

​Adiamento da lei antidesmatamento da União Europeia: impactos políticos e econômicos no Brasil

Uma análise sobre a postergação da implementação da legislação e suas consequências para o comércio e a produção agrícola

Fred Almeida - Com Comprerural
Foto: reprodução
O recente adiamento da entrada em vigor da lei antidesmatamento da União Europeia é um tema que merece atenção, especialmente no contexto atual em que o Brasil se destaca como um dos maiores exportadores de commodities agrícolas do mundo. Originalmente prevista para entrar em vigor em dezembro de 2024 para grandes operadores e comerciantes, e em junho de 2026 para micro e pequenos empreendedores, a decisão de postergar a aplicação dessa legislação reflete uma preocupação com a sustentabilidade e a responsabilidade dos fornecedores. Contudo, essa medida levanta questões profundas sobre o equilíbrio entre proteção ambiental e viabilidade econômica.

O adiamento foi solicitado por países como o Brasil, outros membros do Mercosul e até mesmo nações da própria União Europeia, como Itália, Espanha e Alemanha, que reconhecem a importância do mercado europeu para suas exportações. A lei visa proibir a importação de produtos agrícolas oriundos de áreas desmatadas após 31 de dezembro de 2020. Porém, a sua implementação ainda depende da aprovação do Parlamento Europeu. Para o Brasil, o setor de carne bovina estima uma redução de até 90% no volume vendido ao bloco, o que pode ter consequências drásticas não apenas para a economia, mas também para a segurança alimentar.

As razões por trás dessa postergação vão além da necessidade de mais tempo para os fornecedores se adequarem às novas exigências. Existem preocupações políticas e sociais que não podem ser ignoradas. O enfraquecimento da agenda verde na Europa, que tem perdido força nos últimos anos, é um fator crucial. Além disso, a ameaça de inflação — que voltou a assombrar o continente, especialmente após o recente aumento no Reino Unido — torna a situação ainda mais delicada.

A mudança na data de aplicação da lei impacta diretamente o preço de diversas commodities exportadas pelo Brasil. Exportadores, conhecidos como traders, estavam em processo de adequação às novas regras, o que implicava em custos adicionais para os produtores que buscavam atender a essas exigências. Com a postergação, há a possibilidade de que importadores europeus optem por comprar commodities mais baratas de fornecedores que não investiram na adequação, criando um cenário em que a competitividade do Brasil pode ser afetada.

É curioso notar que, apesar das discussões em torno da legislação europeia, existe uma legislação brasileira, o Código Florestal, que é uma das mais restritivas do mundo no que diz respeito à abertura de novas áreas para a agricultura. Aprovado em 2012, o código estabelece limites rigorosos para o desmatamento legal nas propriedades, o que demonstra o compromisso do Brasil com a preservação ambiental. No entanto, a aplicação da lei antidesmatamento da União Europeia pode resultar na proibição da exportação de produtos que foram cultivados em áreas legalmente desmatadas, criando uma contradição que é difícil de ignorar.

O debate sobre a lei e suas consequências continua a ser um tema polarizador. Críticos argumentam que as restrições impostas pela União Europeia são uma forma de barreira não tarifária disfarçada de preocupação ambiental, prejudicando as exportações brasileiras sem considerar a realidade do processo produtivo no país. O adiamento da lei abre uma pequena janela para reavaliações e discussões, embora as chances de uma mudança significativa sejam remotas.

No fim das contas, o que fica claro é que a interseção entre legislação ambiental e comércio internacional é complexa e repleta de nuances. O adiamento da lei anti-desmatamento da União Europeia não é apenas uma questão de prazo; é um reflexo das tensões políticas e econômicas que permeiam as relações entre continentes e a busca por um futuro sustentável para todos. É uma lição importante que nos lembra que a preservação ambiental deve andar de mãos dadas com a viabilidade econômica, garantindo que as necessidades de todos os envolvidos sejam consideradas.


 

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