Boi 777 revoluciona a pecuária de corte brasileira com maior eficiência e qualidade

Especialista explica com a tecnologia promove a redução no tempo de abate e eleva a rentabilidade do setor

André Luiz Casagrande
11/07/2025 09h41 - Atualizado há 9 horas
Boi 777 revoluciona a pecuária de corte brasileira com maior eficiência e qualidade
Foto: Raquel Brunelli / Embrapa

A tecnologia denominada Boi 777 é fruto das pesquisas desenvolvidas na Apta Regional de Colina/SP, nos diferentes elos da cadeia produtiva de bovinos de corte. Dentro da porteira da fazenda, a cadeia é dividida nas fases de cria, recria e terminação. A fase de cria termina no desmame dos animais,  normalmente aos 7/8 meses de idade. Inicia-se então a fase de recria, que pode durar de 08 a 24 meses e, a partir daí, a fase de terminação, que pode acontecer no confinamento ou a pasto.

Entretanto, há uma série de pontos de atenção nessas três fases. Para explicar todo esse processo, a Coluna Gestão Robusta do Canal Pecuarista entrevistou o Pesquisador Científico da Apta Regional de Colina, da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Flávio Dutra de Resende, que fala também sobre como a adoção dessa tecnologia impacta na evolução do segmento,

Gestão Robusta: Como funciona a Tecnologia Boi 777?

Flávio Dutra de Resende: Primeiramente vamos explicar o significado dos três setes. O primeiro 7 corresponde a fase de cria, onde os animais são desmamados com 7@, ou seja, 210 kg.  Aqui vem o primeiro questionamento: por que o peso médio ao desmame dos bezerros no Brasil está bem abaixo disso, cerca de 170 kg? Porém há fazendas com peso ao desmame acima de 240 kg. Aqui, o pecuarista precisa começar a perguntar porque o peso médio está baixo e o que precisa ser feito para melhorar esse indicador de renda da fazenda, pois o mercado brasileiro passou de comprar bezerro ¨na perna¨ para pagar por kg de peso corporal, assim bezerros mais pesados deixam mais receita para o pecuarista de cria. Para o criador, ele sabe que o chamado bezerro do cedo (nascimento nos meses de agosto/setembro) são mais pesados ao desmame quando comparado com os bezerros do tarde (nascimento em novembro/dezembro). Estamos falando aqui numa diferença média de 30 kg no desmame. Isso é muito dinheiro que está escapando do sistema de produção. Agora, para o bezerro nascer cedo, a vaca precisa emprenhar cedo e sua condição de escore corporal precisa ser boa no início da estação de monta (acima de 3, numa escala de 1-5) para que ela venha a emprenhar logo no início da estação de monta. Esse ponto aqui é fundamental para o sucesso da fazenda de cria. A nossa recomendação é fazer avaliação de escore corporal nos meses de fevereiro/março; desmame, ao parto e no início da estação de monta. Nossos estudos evidenciaram que as perdas de escore corporal durante a metade final da gestação impactam diretamente no desenvolvimento do bezerro após o nascimento, ou seja, nossas pesquisas evidenciaram 18 kg a mais de peso no desmame e 1,2@ na carcaça no abate, mesmo sendo animais de mesmo padrão genético e manejo sanitário. Mediante as avaliações de escore corporal das matrizes antes do desmame tradicional (7/8 meses), o pecuarista pode antecipar a idade no desmame e, com isso, aliviar a vaca que recupera a sua condição corporal, parindo com melhor escore e chegando no início da estação de monta em condições de emprenhar mais cedo. Assim, a próxima gestação acontecerá em períodos de melhores condições das pastagens, e esse ciclo, chamado de mais virtuoso, aumenta o peso médio da bezerrada.
O segundo 7, corresponde à fase de recria, cuja duração média é de 12 meses. Assim, o animal precisa ganhar 210 kg (7@) em até 365 dias, ou seja, um ganho médio diário (GMD) de 0,575 kg/dia. Parece fácil, mas não é, pois na prática, o período entre o desmame (maio/junho) até o início do período chuvoso (novembro) tem 150 dias ou mais, e coincide com a época dos piores pastos, tanto do ponto de vista quantitativo, mas principalmente, qualitativo. Em condições normais, nesse período, os animais tem GMD zero ou até negativo, comprometendo o GMD global da recria. Esse ponto foi estudado exaustivamente nas pesquiisas, evidenciando a necessidade de uso de proteinados e proteico-energéticos nessa fase. Seguindo a fase de recria, agora durante o período das águas, a necessidade de manejo de pasto, ofertando folhas verdes aos animais, de melhor qualidade, garantem desempenho acima de 0,8 kg/dia, porém devido a uma série de problemas de manejo nas fazendas, esse GMD está abaixo de 0,6 kg/dia; ou seja a meta de colocar 0,575 kg/dia em até 12 meses está ficando cada vez mais distante e a rentabilidade da fase de recria, cada vez mais comprometida. Para finalizar a fase de recria, agora no período de outono (abril/maio), onde as pastagens começam a declinar a qualidade, as correções nutricionais, realizadas via suplementação, tornam-se imprescindíveis para alcançar a meta produtiva de colocar 7 arrobas em 1 ano de duração.
Finalizando a fase de recria, agora o animal estará com aproximadamente 20 meses (8 meses de cria + 12 meses de recria), pesando 14 arrobas (7+7). Esse animal poderá ser terminado a pasto ou em confinamento. Nesta fase, o importante é saber o ganho médio diário de carcaça (GMD_CAR). Se o animal de 420 kg (peso final da recria) tem 210 kg de carcaça (50% de rendimento) e ao abate, essa carcaça pesou 315 (21@), o animal ganhou 105 kg de carcaça, ou seja 7@.  No somatório dos três 7, é factível abater um animal com 21 @ em até 24 meses. Com as pesquisas, fundamentou-se o Sistema de terminação intensiva a pasto (TIP), com o qual consegue-se GMD_CAR similares aos obtidos no confinamento convencional.
As pesquisas demonstram que os bezerros nascidos no cedo tem maior GMD_CAR na fase de terminação, por isso os investimentos realizados na fase de cria para fazer a vaca emprenhar mais cedo, com consequência no maior peso ao desmame, final da recria e no gancho do frigorífico.

Gestão Robusta:Qual a metodologia aplicada?

Flávio Dutra de Resende: A metodologia é aplicada através do estabelecimento de metas produtivas nas diferentes fases do ciclo produtivo. Na fase de cria, o pecuarista precisa saber os índices de fertilidade do lote (entender o % de vacas gestantes no início/meio e final da estação de monta) e aqui montar a estratégia para aumentar o % de vacas prenhe no início da estação de monta.  Estratégias como ajuste de lotação da fazenda, após o diagnóstico de gestação, faz toda a diferença em preservar mais pasto para as vacas gestantes e com bezerro ao pé. Outra questão é para a categoria gestante e com condição corporal mais baixa e com bezerro ao pé, a antecipação da idade ao desmame precisa entrar no planejamento da fazenda para recuperar a condição corporal da vaca. Quanto melhor o escore corporal ao parto, maior a probabilidade de a vaca ficar prenhe no início da estação de monta. Aqui fica uma pergunta: quantos kg de bezerro desmamado por vaca exposta a sua fazenda está produzindo? Lembre-se que as melhores fazendas de cria estão produzindo no mínimo 160 kg de bezerro por vaca exposta. A metologia proposta no sistema 777 é que o produtor meça o que esta fazendo e que entenda o passo a passo para melhorar os índices usando as tecnologias existentes no mercado.
Na fase de recria, o produtor precisa ter a sua meta produtiva aliada a meta econômica. Aqui não existe o certo ou errado, existirá sempre a necessidade de planejar (medir, medir....) e no final do ciclo de recria, avaliar o que deu certo ou errado e isso é um aprendizado constante.
Na fase de terminação, o produtor precisa avaliar o ganho em carcaça e, mediante os melhores ganhos, passará a melhor eficiência biológica da @ produzida, reduzindo o custo da @ produzida. O modelo 777 é igual a um prédio; o primeiro 7 é o alicerce: o produtor só conseguirá produzir carcaças mais pesadas e mais jovens, se o alicerce foi bem construído.
Partindo da premissa que a média de idade ao abate no Brasil está em 36 meses e o peso médio de carcaça 20@, o sistema 777 permite o produtor produzir mais em menos tempo, ou seja 21@ em 24 meses

Gestão Robusta: Qual a importância da gestão e manejo para o sucesso desse processo?

Flávio Dutra de Resende: O produtor precisa estabelecer as suas metas produtivas e, para entender se o os índices planejados estão sendo alcançados, precisa medir sempre, corrigir quando há desvios de rotas e procurar melhorar sempre.  Na opinião da APTA Regional de Colina, uma fazenda de pecuária que não implementar um sistema de gestão eficiente está fadada a desaparecer nos próximos anos. Aqui vale lembrar as margens da fazenda nos anos 80/90 e hoje. Estamos falando de uma margem de 40 % ou mais, para margens abaixo de 20 % nos dias atuais. Cada vez mais temos que produzir mais em menos tempo e esse é o ponto da importância da gestão.

Gestão Robusta: Quais os principais desafios dos pecuaristas para implementação dessa tecnologia?

Flávio Dutra de Resende: As fazendas tem desafios diários, porém precisam entender que o que importa é o que está na última linha da planilha (R$). Para isso, o desafio é começar a medir e saber quanto custa produzir em função da tecnologia adotada. A pergunta sempre será: compensa ou não compensa usar esta tecnologia, nessas condições? A fazenda precisa ter balança e não basta ter balança, tem que acompanhar a evolução do desenvolvimento dos animais, afinal é o GMD que paga a conta de cada animal na fazenda.
Aqui um desafio:  qual o GMD que o seu lote de recria, por exemplo, tem que ter para pagar o ágio da compra do bezerro, do aluguel do pasto, da sanidade, mão-de-obra, manutenção de cercas, maquinários etc? Quando passamos a olhar para isso, passamos a entender que uso de suplementação, adubação, sanidade, touro/sêmen de qualidade não é custo, e sim investimento.
Pontos relacionados a infraestrutura e mão-de-obra são importantíssimos e, principalmente, quando usamos mais tecnologia, temos que implementar mais pontos de controle para entender os resultados dos investimentos realizados.


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