O assunto do momento é a liberdade de expressão, matéria importante demais para que deixemos passar batido. O tema é amplo e essa coluna é específica – aqui tratamos de economia. Então, por que trazer um tema que parece tão desconexo?
A liberdade de opinião é base fundamental na cultura ocidental e para o progresso do conhecimento, seja na sua vertente filosófica – a dialética, seja na sua forma científica – o confronto de hipóteses. É pelo confronto de ideias que a cultura ocidental se desenvolveu e deve seu sucesso. Assim, é salutar que opiniões, visões, teses e hipóteses contraditórias sejam confrontadas em um ambiente com liberdade suficiente para que todas elas possam florescer.
Nos últimos anos, no entanto, cresceu o fenômeno das fake news ou desinformação. Algo típico do momento atual, em que muito da vida das pessoas foi transferida para as redes sociais, local onde opiniões aparecem com facilidade, dando oportunidade a todo tipo de conteúdo: alguns fracos, outros tendenciosos, sensacionalistas, e boa parte simplesmente mentirosos. Todo esse conteúdo de baixa qualidade, apenas espelha a personalidade das pessoas que movimentam as redes, e ainda não é possível excluir o mal da personalidade das pessoas. Cabe a cada um fazer o seu próprio filtro e buscar informação confiável.
Nos últimos anos tem sido vendida a ideia de que é necessário um forte controle sobre as redes sociais, uma moderação contra os problemas acima. Mas quem separa o joio do trigo? Ou ainda pior: quem determina o que é joio e o que é trigo? Na prática, existe apenas a adoção de um discurso oficial como a verdade e todo contraditório, como fake news. Essa é uma semente totalitária que pode dar maus frutos.
Em economia, esse risco está perigosamente real. Uma analise econômica, quando não condiz com o posicionamento oficial, vai configurar desinformação? Já existe um movimento para descredibilizar os que não se alinham com a versão oficial. O BC, recentemente publicou em seu site um estudo onde afirma o crescimento das fake news dentro da economia: Desinformação sobre economia – aumento das “fake news” sobre inflação.
A inflação é dinâmica, variando de lugar para lugar. Uma “média” é usada como parâmetro, mas não é tecnicamente errado alguém dizer que sente que a inflação está maior ou menor do que o noticiado. Inflação se manifesta de forma diferente em cada região, depende da cesta de bens e qual é a variação no preço dos principais itens de consumo daquela pessoa. Quem quiser dizer que está achando a inflação muito maior ou menor, está promovendo desinformação ou apenas externalizando sua realidade? E se um analista independente encontrar inconsistências nos números, poderá publicar?
Ao divulgar o resultado recente do PIB, muitos elogiaram o bom desempenho do governo, que apresentou bons números. No entanto, um analista crítico pode lembrar da dependência excessiva do setor primário e apontar que o número esconde problemas, como, por exemplo, um crescimento inflado pelos gastos do governo — só possível devido a um grande e crescente déficit, a ser pago no futuro, e com altos juros. Esse analista também tem bons argumentos para discordar da gestão do governo, e sua crítica não pode ser classificada como mera fake news.
É importante a liberdade dos analistas de fazer apontamentos, de confrontar, sejam eles parciais ou não. Ao usar o fenômeno das fake news como justificativa para censura, na prática tem-se a implementação do discurso único, eliminando o contraditório; e hoje é evidente a tentativa de promover a versão oficial como única aceitável. Assemelha-se muito com o início da construção de um discurso totalitário, semelhante ao chinês, onde apenas a versão oficial é admitida e qualquer outra dissidente é criminalizada.