O principal índice da bolsa de valores brasileira voltou a refletir a piora na percepção dos riscos domésticos e terminou o pregão em queda firme, retornando ao patamar dos 118 mil pontos. Analistas apontam que o cenário ainda incerto do ponto de vista fiscal, a turbulência política em Brasília e o agravamento da crise hídrica se somaram ao dia negativo para commodities, conjunto de fatores que acabou derrubando novamente o Ibovespa.
O índice fechou o dia em queda de 0,80%, aos 118.781 pontos, após ter marcado 117.911 nas mínimas intradiárias. Em agosto, o recuo mensal foi de 2,48% e, com isso, o Ibovespa chegou aos dois meses consecutivos de perdas, período em que acumula queda de 6,32%. O volume financeiro agregado negociado na bolsa brasileira hoje foi de R$ 38,57 bilhões.
O pano de fundo global para as commodities não ajudou o Ibovespa hoje. Na Bolsa de Commodity de Dalian, na China, os contratos mais negociados do minério de ferro recuaram cerca de 5%. Já o petróleo Brent terminou o pregão em queda de 0,57%, anotando perdas de 3% no acumulado de agosto.
Assim, as empresas ligadas a materiais básicos tiveram desempenho negativo na sessão. As ações da Vale ON recuaram 1,37% e, pressionadas por dados mais fracos do que o esperado da economia chinesa, as siderúrgicas também caíram. CSN ON caiu 4,99%, Gerdau PN teve baixa de 1,29% e Usiminas PNA anotou perdas de 0,80%.
No entanto, os fatores internos foram apontados, novamente, como motivos importantes para a desvalorização das ações locais hoje. A própria queda expressiva nos papéis da Petrobras ON e PN, que caíram 2,79% e 3,92%, respectivamente, foi atribuída a temores de ingerência do governo na estatal, após declarações do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), no início do dia.
Em Brasília, a temperatura política segue elevada e agentes financeiros relatam desconforto com a proximidade das manifestações agendadas para o dia 7 de Setembro. "O tomador de risco precisa de um ambiente institucional melhor. Muito estrangeiro fica impressionado com a deterioração da nossa institucionalidade", afirma o gestor da Arena Investimentos, Mauricio Pedrosa.
Outro risco que segue latente está relacionado à situação hidrológica brasileira. Durante evento na manhã de hoje, o economista-chefe do Itaú Unibanco, Mario Mesquita, revelou que o banco passou a projetar 10% de chance de racionamento, mas ressaltou que pode haver períodos de escassez de energia regionalizados no país.
Além dos riscos mais elevados de uma perda de crescimento da economia no ano que vem, a energia elétrica mais elevada também vem provocando revisões nas perspectivas de inflação entre os agentes financeiros, que passam a esperar sinalizações mais duras do Banco Central para conter a alta dos preços.
"Diferentes casas especializadas, tanto no setor quanto na questão hidrológica, passaram a aumentar as expectativas de racionamento para números mais altos. A gente pode ver ações do setor sendo impactadas de forma mais acentuada", afirma a especialista em ações da Clear Corretora, Pietra Guerra.
Segundo ela, a dinâmica da curva de juros acaba afetando setores sensíveis às variações nas taxas, como o próprio setor elétrico. "As ações do segmento de utilidade pública são impactadas negativamente pela alta dos juros, já que o setor demanda financiamentos de longo prazo. por toda a característica de operação, projetos e custos altos de investimento", afirma.
A alta da inflação, por outro lado, pode diminuir o espaço no orçamento das famílias brasileiras e prejudicar o consumo. Assim, segundo Mauricio Pedrosa, da Arena Investimentos, pode haver impacto nas teses otimistas para o setor de varejo brasileiro.
As ações da Via ON recuaram 3,44%, enquanto os papéis da Magazine Luiza ON fecharam em queda de 3,39%. Hering ON caiu 2,62%.
"Já há perspectivas para um quadro de estagflação no ano que vem. Muita gente já está incorporando nos preços a expectativa de um crescimento baixíssimo e inflação incomodando bastante", afirmou Pedrosa.