A CPI da Covid ganhou nesta terça-feira (31) uma chance de sobrevida ao surgirem informações de que um motoboy ligado à empresa VTCLog teria pago despesas pessoais de Roberto Ferreira Dias, ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde. A revelação, feita pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL), resultou em pedidos de novos depoimentos que podem estender o prazo para apresentação do relatório final.
O motoboy Ivanildo Gonçalves da Silva tinha depoimento previsto para ontem, mas um habeas corpus expedido pelo ministro Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), o desobrigou de comparecer. A medida é inédita na CPI, que até então só havia esbarrado em decisões do STF que garantiam o direito ao silêncio — mas sempre com obrigação de comparecimento.
Gonçalves foi convocado como testemunha após virem a público informações de que ele teria feito saques e transportado quase R$ 5 milhões em espécie. Os senadores querem saber os detalhes sobre os destinatários dos recursos. A VTCLog tem vários contratos com o Ministério da Saúde, incluindo um para o recebimento e estocagem de lotes de vacinas contra a covid-19.
Confirmada a ausência do motoboy, a comissão tentou convocar às pressas a CEO da VTCLog, Andreia Lima. Alegando compromissos inadiáveis — entre os quais o recebimento de uma carga de vacinas da Pfizer —, a executiva informou que não poderia prestar depoimento hoje.
"A CEO Andréia Lima está à disposição para contribuir com os trabalhos da CPI, mas devido à agenda prévia de viagem relacionada à logística de distribuição das vacinas, não poderá comparecer à Comissão nesta terça-feira", informou a empresa.
Enquanto os senadores discutiam os próximos passos, Renan trouxe a informação de que o motoboy teria pago boletos de Dias. Os pagamentos se referem a dívidas do ex-diretor com a Voetur, empresa de turismo que é controladora da VTCLog. Questionada sobre esses pagamentos, a empresa não se manifestou.
Em seguida, o relator apresentou imagens de circuito interno que mostram o motoboy entrando em uma agência bancária no mesmo dia e horário em que um boleto de R$ 6 mil em nome de Dias foi pago. Renan mencionou outros pagamentos, em valores até maiores, sempre em favor do ex-diretor, demitido sob suspeitas de ter pedido propina.
Após as revelações de Renan, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), sugeriu que a CPI recorresse do habeas corpus do STF e que o motoboy fosse reconvocado. O entendimento é de que as imagens apresentadas seriam suficiente para que Nunes Marques recue da decisão e obrigue o comparecimento à comissão.
O caso fez com que alguns parlamentares presentes relembrassem situações parecidas ocorridas em CPIs passadas, como a do caseiro Francenildo Costa, cujo depoimento resultou na queda do então super ministro petista Antonio Palocci. Outro episódio rememorado foi o do motorista Eriberto França, testemunha chave no impeachment do ex-presidente Fernando Collor.
Randolfe também defendeu a convocação de outros diretores da VTCLog e informou ao relator que, possivelmente, a data de apresentação do relatório final da CPI tenha que ser adiada. Antes, Renan havia dito que o documento seria apresentado no máximo, até o dia 22 de setembro.
O relator quer ouvir no próximo dia 13 a advogada Karina Kufa, que tem entre seus clientes o presidente Jair Bolsonaro. Ela é suspeita de ter facilitado encontros entre lobistas envolvidos em negociações para venda de vacinas ao governo. Na segunda-feira (30), a advogada reclamou de ter seu nome envolvido e negou qualquer relação com as negociações.
Alguns dos personagens ligados à Kufa têm depoimento marcado para esta semana. Nesta quarta-feira (1º de setembro) será a vez do empresário Francisco Tolentino, apontado como sócio oculto da empresa FIB Bank, que deu garantias financeiras para a Precisa Medicamentos no contrato para venda da Covaxin ao governo. Na quinta-feira (02) o depoente será o lobista Marcony Albernaz, também ligado à Precisa.