Por todo canto que tenho andado, converso com produtores rurais sobre as negociações, desenvolvimento das safras, de rebanhos bovinos e, percebo, apesar de alguns percalços no ano de 2020, para o pecuarista, uma clara percepção de negócios, de uma agropecuária cada vez mais forte. Com o foco, em nossa coluna, na pecuária bovina de corte e com a necessidade de estar mais atento ao consumo nacional de carnes, abordo neste texto a movimentação em algumas praças brasileiras.
O varejo de carne bovina é algo que sempre esteve em foco, particularmente. Desde os meus tempos da fantástica equipe do programa Cadeia Produtiva da Carne Bovina de MS, do Sebrae/MS, passando pela dissertação de mestrado, com abordagem a este tema. Enfim, o contato e o interesse pelo segmento sempre esteve presente. E eu quis saber o que ocorre no varejo de carne bovina. A abordagem neste texto foi através de cinco fontes duas na cidade de São Paulo, outras três em Campo Grande/MS.
É necessário diferenciar algumas particularidades neste chamado “varejo”. O grande varejo, representado por grandes redes supermercadistas com a maior parte das vendas de carne “commoditie” mas com movimentação muito boa para cortes especiais. O pequeno varejo, que em São Paulo (na parte pesquisada) significa cortes especiais, de raças específicas, muito informação para o consumidor. Em Campo Grande há este mesmo tipo de loja, mas também as tradicionais casas de carne / açougues com vendas em boas escalas de volumes (como em outras cidades do Centro-/Oeste, Sul do Brasil, Minas Gerais, etc).
Sem citar nomes de redes, o grande varejo alega ter absorvido parte relevante das altas da carne bovina nos últimos anos e, em alguns momentos, ter vendido alguns cortes com margens negativas. Uma meia verdade: na organização dos supermercados brasileiros, as carnes, de forma geral, (como as padarias) são elementos importantes para venda de outros produtos das chamadas mercearias seca e doce, FLV e até mesmo no setor de bazar.
Entretanto, a frase inicial do último parágrafo, dita praticamente de maneira idêntica por gestores de hipermercados diferentes, de estados e capitais distintas, era para explicar a lentidão no recuo de preços ao consumidor final. Naquele momento, quando a China pulou fora, o impacto foi imediato para os pecuaristas. Arroba desabou naquele período. A carne no atacado caiu em velocidade moderada, já os preços ao consumidor nunca refletiram redução das margens que a pecuária de corte brasileira teve no campo. Minha interpretação é do pecuarista ter perdido rendimento (custo de oportunidade muito alto), a indústria exportadora perdeu um pouco e o grande varejo “empatou”, matematicamente falando.
Mas eu queria saber mesmo era de consumo. As grandes redes apontam números em volume parecidos com os de 2019, com alguma preferência por cortes de dianteiro neste começo de dezembro, o traseiro está bem inflacionado (explico daqui a pouco). Os gestores informaram também elevação nas vendas de carnes de frango e suína no decorrer do ano.
O “pequeno varejão” de carne bovina de Campo Grande/MS, cidade com muita tradição de consumo de carne vermelha, teve reduções de volumes de vendas de carne bovina durante o ano (mas não teve de rentabilidade) se vendeu menos por mais e também uma mescla no consumo médio entre os chamados cortes de traseiro e dianteiro é claramente identificada. Neste começo de dezembro as vendas estão fortes, superiores ao ano passado e parecido, em parte, com 2019.
Uma observação específica que serve para diversas localidades no assunto carne, talvez para o país inteiro, esteja no processo de inflação brasileira e a grande volatilidade no país seja na “força” da própria moeda, o Real, ou da taxa básica de juros. O Real segue muito desvalorizado, fato, cenário difícil de mudar em curto e médio prazo. Reduzir ou aumentar taxas de juros de forma brusca deixam o mercado muito volátil. Questões econômicas do Ministério do mesmo nome e também do Comitê de Política Monetária Nacional.
Para resumir temos inflação em todos os aspectos e classes sociais. Entretanto, quanto menor é a renda, maior é a inflação. Uma gangorra ruim para todos, mas pior para os mais pobres. No caso da carne bovina, os cortes de dianteiro estão com preços robustos, mas longe do teto mensurado pelo Cepea/USP. Já os cortes de traseiro, mais nobres, estabeleceram um novo teto. Os dados em si, explicam a mescla que a classe média tem feito no consumo de carnes, com cortes de traseiro e dianteiro, mantendo os números de vendas.
Essa conversa toda, com as questões de consumo e econômica, são por um motivo claro. O mercado interno é muito importante e não é apenas no final de ano.
Por fim, as duas boutiques de carnes que consultei, uma em São Paulo, outra em Campo Grande, apontam para vendas muito boas, com taxas de crescimento em 2021, mas com vendas, também, de cortes “especiais” de dianteiro. São nichos específicos e um público menos afetado pelas questões citadas anteriormente.
Finalizando, nesta última semana os frigoríficos conseguiram estabelecer uma escala melhor de abates, esticaram. Para chegarem lá, pagaram mais, isso ocorreu antes do dia 10 de dezembro como havíamos previsto na coluna. Exatamente na última quinta-feira as propostas de compra começaram a reduzir, mas o pecuarista não recuou, com isso, pouco volume de negócios. A percepção é de ter alguma janela melhor de oportunidade venda de boi gordo na próxima semana. Fique de olho.