O risco fiscal voltou ao centro das atenções dos agentes financeiros nesta sexta-feira (30), conforme as discussões acerca do novo formato do Bolsa Família ganharam tração, levantando a possibilidade de uma ameaça ao teto de gastos, o que contribuiu para estressar as taxas futuras.
Declaração do ministro da Economia, Paulo Guedes, citando chance de um aumento dos gastos extraordinários à frente, manteve o mercado tenso durante a maior parte da sessão de hoje. Os avanços mais pronunciados na curva de juros ocorreram nas porções intermediária e longa, onde chegaram aos 30 pontos-base (0,3 ponto percentual) contra o ajuste anterior.
Assim, finalizado o pregão regular, às 16h, a taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2022 subiu de 6,20% no ajuste anterior para 6,31%; a do DI para janeiro de 2023 escalou de 7,56% para 7,79%; a do contrato para janeiro de 2025 disparou de 8,36% para 8,67% e a do DI para janeiro de 2027 anotou avanço de 8,72% para 9,02%.
Por mais que Paulo Guedes tenha dito, hoje, que o teto de gastos não será ultrapassado pelo novo Bolsa Família, que deve exigir de R$ 25 bilhões a R$ 30 bilhões para que o benefício alcance entre R$ 250 e R$ 300, agentes financeiros relataram tensão disseminada no mercado com falas dele cogitando possíveis despesas extraordinárias à frente.
“Foi uma fala infeliz e o mercado piorou a partir dali”, diz Cássio Xavier, gestor de renda fixa da Sicredi Asset. “Claro que se houvesse um movimento mais positivo dos ativos de risco no exterior, não haveria uma reação dessa magnitude, hoje. Mas o grosso do movimento está ligado a questões locais, principalmente um temor fiscal relacionado a mais gastos.”
Em entrevista ao Valor, ainda pela manhã, Guedes reforçou a defesa da âncora fiscal. “O Orçamento está preparado para mandar um Bolsa Família mais robusto. Não está no plano furar o teto para fazer o Bolsa Família”, afirmou.
Hoje, o jornal“ ”O Estado de S. Paulo” publicou que a ala política do governo estaria defendendo tirar o novo programa social do teto. Além de Guedes, o Valor falou com outras quatro fontes, das quais três negaram que isso esteja em discussão e uma admitiu que há pessoas defendendo dentro do governo.
Outros fatores locais também influenciaram a dinâmica dos juros, na avaliação de Xavier. “Hoje é uma data crítica para as projeções de Selic”, diz Xavier, em referência às previsões de instituições que são recolhidas pelo Banco Central para o Boletim Focus, sempre divulgado na segunda-feira. “Os economistas tendem, cada vez mais, ao 1 ponto percentual, em vista da dinâmica inflacionária negativa pior do que a antecipada”, avalia.
O mercado, atualmente, atribui chance majoritária a uma elevação de 1 ponto da taxa Selic na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) de agosto. Além disso, segundo precificação extraída da curva, também passou a dar possibilidade maior a um aperto ainda mais forte, de 1,25 ponto, no Copom de setembro.
O exterior também contribuiu, em medida menor, para azedar o clima no mercado local. A leve aversão a risco externa, em meio à perspectiva de desaceleração das vendas da Amazon e à alta da inflação na zona do euro, deixou ativos de risco no campo negativo e ajudou a elevar as taxas futuras ao longo de toda a estrutura da curva a termo, fazendo-as operarem em alta desde o princípio do pregão, aponta Carlos Cardoso, gestor e fundador da BRDR Asset.