O dólar acelerou ainda mais a alta contra o real, no momento em que o mercado ainda coloca nos preços o aumento dos riscos fiscais. A possibilidade de o Bolsa Família ficar fora do teto de gastos continua a ativar um modo de aversão a risco e nem mesmo declarações do ministro da Economia, Paulo Guedes, de que o programa não ameaça o teto surtiram efeito. Pouco antes de 15h45, o dólar era negociado a R$ 5,1882, avanço de 2,15%, após máxima de R$ 5,1982.
No mercado de juros, o sentimento de aversão a risco é semelhante e as taxas operam em altas superiores a 30 pontos-base em alguns vencimentos. Há pouco, a taxa do DI para janeiro de 2023 subia de 7,56% para 7,77%; a do DI para janeiro de 2025 saltava de 8,36% para 8,66%; e a do DI para janeiro de 2027 disparava de 8,72% para 9,02%.
“O mercado estava ignorando as notícias relacionadas ao Bolsa Família, até porque já passamos por isso este ano com o auxílio emergencial fora do teto. Hoje, porém, o Guedes disse que tem fumaça no ar e que realmente existe gente pensando em tirar o programa do teto. É o motivo de todo o estresse que estamos vendo no mercado”, avalia um gestor que prefere não se identificar.
Por mais que o ministro da Economia, Paulo Guedes, tenha dito hoje que o teto de gastos não será ultrapassado pelo novo Bolsa Família, que deve exigir de R$ 25 bilhões e R$ 30 bilhões para que o benefício alcance entre R$ 250 e R$ 300, agentes financeiros relatam tensão no mercado com falas dele sobre possíveis despesas extraordinárias à frente.
Em evento no Rio de Janeiro, Guedes apontou para a possibilidade de despesas extraordinárias à frente, o que acelerou o movimento de depreciação do real observado desde o início do dia. “A conversa de furar o teto pegou em cheio o humor do mercado. O Guedes acabou furando o balão de ensaio ao apontar para a chance de mais gastos extraordinários”, diz um profissional do mercado.
“A declaração contribuiu para elevar o estresse, em um dia em que o mercado global já não é positivo. O grande temor no Brasil é se aventar um aumento de gasto extraordinário, pois ele pode muito bem virar permanente. Aumenta o receio quando o ministro da Economia fala dessa possibilidade”, diz Carlos Cardoso, gestor e fundador da BRDR Asset.
Ao Valor, Guedes reforçou a defesa da âncora fiscal. “O Orçamento está preparado para mandar um Bolsa Família mais robusto. Não está no plano furar o teto para fazer o Bolsa Família”, afirmou ele.
Hoje, o jornal “O Estado de S. Paulo” publicou que a ala política do governo estaria defendendo tirar o novo programa social do teto. Além de Guedes, o Valor falou com outras quatro fontes, das quais três negaram que isso esteja em discussão e uma admitiu que há pessoas defendendo isso dentro do governo.
Além dos riscos fiscais em alta, fatores técnicos também apontam para um cenário mais desafiador para a moeda brasileira. “A posição técnica estava muito ruim porque tanto os fundos locais quanto o investidor estrangeiro baixaram muito a posição comprada [em dólar contra o real]. Pode ser que eles estejam voltando a comprar dólar para se proteger. Temos que ver que o fluxo para a bolsa foi negativo recentemente”, afirma um gestor que prefere não se identificar. Além disso, ele nota que o dólar furou a média móvel de 50 dias (R$ 5,13), o que fez a alta da moeda acelerar durante a manhã.