26/08/2021 às 20h00min - Atualizada em 26/08/2021 às 20h00min

Ibovespa volta a refletir preocupações locais e perde os 119 mil pontos

Na véspera da participação de Jerome Powell, o presidente do Federal Reserve (Fed), no simpósio anual de Jackson Hole e em meio a crescentes tensões no Afeganistão, o pano de fundo global para os negócios foi de cautela desde o início do dia. No entanto, refletindo temores locais, como o agravamento da crise hídrica, o Ibovespa voltou a anotar desempenho bem pior do que seus pares e encerrou em queda firme, perdendo o patamar dos 119 mil pontos.

O Ibovespa encerrou a sessão aos 118.724 pontos, em queda de 1,73%, próximo das mínimas do dia de 118.808 pontos. O giro financeiro agregado na bolsa local hoje foi de R$ 27,1 bilhões. Em Nova York, o S&P 500 terminou o dia em queda de 0,58%, o Dow Jones recuou 0,54% e o Nasdaq teve perdas de 0,64%. Na Europa, o Stoxx 600 encerrou em baixa de 0,32%.

No exterior, a postura mais paciente dos investidores globais foi justificada pela proximidade do principal evento global de política monetária. Amanhã, são esperados comentários do presidente do Fed sobre os planos da instituição para o início da redução de suas compras de títulos, o que tem potencial para ampliar a volatilidade nos mercados globais e, particularmente, em países emergentes.

Para Alex Lima, gestor de portfólio da Lifetime Investimentos e ex-operador da mesa de juros do Fed de Nova York, Powell deve anunciar amanhã que o início do tapering - processo de redução da compras de ativos - deve ocorrer no fim do ano ou em janeiro.

"A partir daí, a mesa do Fed de Nova York deve montar um cronograma, indicando o ritmo de redução nas compras. O mercado já vem precificando isso, uma diminuição de US$ 20 bilhões em Treasuries por trimestre no ano que vem - o que encerraria o programa no fim do ano", afirma.

Uma surpresa, segundo ele, seria uma indicação de que o tapering terá início na próxima reunião de setembro, o que poderia causar um aumento de volatilidade nos mercados. Do lado oposto, um novo atraso em comunicar a redução das compras de ativos poderia dar novo impulso aos ativos de risco, segundo ele. "Dada a forte recuperação do mercado de trabalho americano - que criou 1,8 milhão de vagas nos últimos dois meses - e dos níveis elevados de inflação, vejo isso como pouco provável", afirmou.

Apesar disso, o cenário global não explica, integralmente, a performance ruim do Ibovespa hoje.

Gestores e profissionais do mercado relatam que a percepção de que a crise hídrica vem se agravando entrou de vez no radar dos investidores, especialmente após a coletiva de imprensa dada pelo Ministério de Minas e Energia (MME), na noite de quarta-feira.

"A impressão foi a de que o gato subiu no telhado", diz um gestor de renda variável, que também aponta que as percepções negativas de importantes membros do mercado financeiro na Expert da XP, ajudam a consolidar uma visão negativa para os ativos brasileiros.

Ainda há a preocupação que, diante do aumento nos custos da energia elétrica, um ritmo mais firme de aperto monetário promovido pelo Banco Central possa diminuir ainda mais a demanda por ativos de renda variável.

"Quando você fala em energia elétrica na bolsa, óbvio que você vai sentir maiores custos em todas as empresas que têm operações locais, principalmente fábricas. Elas precisam corrigir os preços porque os custos já vêm aumentando", diz Rodrigo Franchini, sócio da Monte Bravo Investimentos.

O tema também foi abordado pelo Credit Suisse hoje. Segundo analistas do banco, a hidrologia no Brasil continua decepcionante, e, com apenas 63% da média de longo prazo desde o início da última estação chuvosa, o governo brasileiro prepara uma série de medidas adicionais para evitar um risco maior de racionamento para 2021 e 2022.

"Como as hidrelétricas têm uma participação de cerca de 65% no sistema brasileiro e o cenário vem se deteriorando, acreditamos que as preocupações com o equilíbrio entre oferta e demanda de 2022 são maiores agora e dependemos de uma melhor hidrologia para a próxima estação chuvosa - de outubro de 2021 a abril de 2022 - para garantir bom equilíbrio para o maior consumo que é esperado para o verão no Brasil", afirmam os analistas de ações do banco, Carolina Carneiro e Rafael Nagano.

"Para o Brasil, prevemos impactos de tarifas mais altas - impacto potencial de 12% para 2022, dependendo do despacho térmico e das tarifas do mecanismo de bandeira. Setores que são pesados em ativos e intensivos no uso de eletricidade, mas não são autossuficientes em energia elétrica, também podem ser impactados por altos custos de energia", afirmam.

O cenário ainda é agravado pelos riscos políticos elevados. Os investidores seguem monitorando as tensões entre os poderes, especialmente até a chegada do dia sete de setembro, quando estão marcadas manifestações em apoio ao governo e que devem trazer críticas a membros de outras instituições.

"A insistência de Bolsonaro em criar ruídos políticos sem fim chega em um momento em que o país tinha motivos para comemorar", afirmam Elizabeth Johnson e Wilson Ferrarezi, economistas da consultoria britânica TS Lombard.

De acordo com eles, apesar da hesitação limitada dos brasileiros em tomar vacinas, da melhora nos números da pandemia, das perspectivas de recuperação econômica e de sinais de melhora de curto prazo na arrecadação do país, o clima político segue pesando nas perspectivas de crescimento do Brasil.

"Em vez de aproveitar esse momento, o presidente Bolsonaro optou por permanecer no caminho da guerra, o que não só está limitando a recuperação do mercado, mas também pesando nas perspectivas econômicas positivas de médio prazo", concluem.

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